por trás de “Memento”

era uma noite de inverno de 2020, em que eu tentava dormir e não conseguia. o drama (daquela semana) era a sensação de que em meio às diversas músicas que eu estava produzindo, nenhuma tinha o perfil pra ser meu primeiro single.

ao mesmo tempo, ecoavam as palavras do Nick (meu amigo e produtor): para de compor, tu já tá sentado em cima de uma pilha de música boa. (frase que ele repete SEMPRE, por sinal.)

00:00, e eu virava de um lado pra outro da cama, tentando dormir. virava pro lado do abajur, ouvia o nick dizer que eu já tinha música demais. virava pro lado da janela, pensava que ainda não tinha aquele primeiro single.

quando eu digo aquele single, eu não quero dizer “driver’s license” da Olivia, algo gigante e epicamente produzido, com um clipe hollywodiano, mas sim uma faixa que em termos de composição fosse rica, completa, e acima de tudo, representasse um momento, ou um sentimento, de forma genuína e cristalina. eu pensava muito em “1950” da King Princess. foi durante o primeiro ano de pandemia que eu descobri a música dela, e pra mim, “1950” era o exemplo de um primeiro single perfeito. bem escrita, produzida, e muito real.

vira pra um lado, vira pro outro, 01:00. pego o celular para consultar a ferramenta número 1 do compositor moderno, o aplicativo Gravador.

scrollando e ouvindo algumas faixas, até chegar em um áudio de mais ou menos 5 minutos que tinha alguns versos interessantes. em alguma entrevista, lembro de ouvir King Princess falando sobre como ela saiu correndo do banho para escrever “1950”, quando um insight veio. e da mesma forma que ela deve ter corrido até a guitarra, eu corri pro computador. e eu juro, isso não foi planejado - o que parece mentira algo que eu escrevo sobre, 2 anos depois.

em algum ponto da madrugada o sono me venceu, mas e sei que no dia seguinte aquela ideia bruta no celular já tinha se transformado em uma demo no desktop. e ao longo dos próximos dois dias, foi sendo re-escrita, aperfeiçoada, e fui depositando naquela letra e música todos o caos emocional que eu havia sentido durante os primeiros meses de isolamento social. a dor dos lutos antigos que foram interrompidos. a dor dos novos lutos que a pandemia gerava. a excitação e a empolgação de sair novamente. o sentimento de dúvida sobre quando isso iria, finalmente, acontecer. uma certa idealização sobre esse dia, que somente seria possível do ponto de vista de quem está isolado há 3 meses… uma bagunça agridoce que só quem viveu aquela época, naquele contexto, pode entender.

mais alguns dias de trabalho e tomei coragem de mandar a demo pro Nick, que, mesmo achando que eu já tinha outras faixas boas, imediatamente viu o potencial de “Memento”.

daquele dia, até a música ser lançada, foi mais de um ano. tanto tempo porque não era apenas sobre “lançar uma música”, mas além disso, decidir como fazer, de que forma, que artista eu iria ser assim que meu primeiro single estivesse na prateleira musical das pessoas, e não mais na minha gaveta de projetos.

dia 26 de novembro de 2021, “Memento” foi lançada, e eu não poderia estar mais feliz com o resultado de todo o trabalho e produção que nós colocamos sobre ela. a música cresceu no som e na potência, mas isso só fez dela um retrato ainda mais fidedigno do sentimento que ela leva em sua composição.

retrato de um momento em que a tristeza já não é mais o sentimento mais forte. um momento em que o luto parece desvanecer, ao invés de sumir. um momento em que a alegria ainda não chegou, mas parece tão confirmada, que fica inevitável idealizá-la ao mais extremo nível.

ouça “Memento” —>

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